
O uso de mindfulness no tratamento do TDAH infantil tem ganhado cada vez mais espaço como uma abordagem complementar no cuidado emocional e comportamental das crianças. Se você trabalha com crianças que têm TDAH, sabe que a rotina delas — e a dos pais! — pode ser cheia de desafios. A dificuldade de concentração, a impulsividade, a agitação… tudo isso impacta diretamente o desenvolvimento emocional e cognitivo.
Justamente por isso, sei o quanto é importante encontrar ferramentas que ajudem essas crianças a se sentirem mais calmas e centradas. As práticas de mindfulness podem ser uma dessas ferramentas transformadoras. Como facilitadora de mindfulness, percebo o quanto os profissionais da infância buscam abordagens que complementem o tratamento tradicional, oferecendo um cuidado mais humano, sensível e eficaz.
Neste artigo, você vai encontrar:
- As descobertas dos estudos mais recentes sobre mindfulness no tratamento do TDAH;
- Ideias simples e práticas para aplicar mindfulness no seu atendimento;
- Sugestões acessíveis, mesmo para quem está começando agora a usar mindfulness com crianças.
O que é mindfulness na prática clínica infantil?
De forma simples, Mindfulness é a habilidade de prestar atenção ao momento presente, com curiosidade e sem julgamento. Na prática, para crianças com TDAH, isso significa criar um espaço seguro onde elas possam:
- Reduzir a impulsividade;
- Melhorar o foco e a concentração;
- Aprender a lidar com emoções difíceis, como frustração e ansiedade.
No contexto terapêutico infantil, essa abordagem se traduz em práticas breves, lúdicas e adaptadas à linguagem da criança o que ajuda a conectar mente e corpo de forma gentil. A prática regular ativa áreas do cérebro responsáveis por tomada de decisão, controle inibitório e empatia — justamente funções que costumam estar comprometidas em quadros de TDAH.
Com isso, ao incorporar jogos, histórias e atividades simbólicas, o mindfulness torna-se não apenas acessível, mas também prazeroso para a criança. Isso fortalece o vínculo terapêutico e promovendo maior engajamento nas sessões.
O que os estudos mostram sobre mindfulness no tratamento do TDAH infantil
Diversos estudos recentes reforçam o papel do mindfulness como uma ferramenta complementar no cuidado com o TDAH infantil.
Por exemplo, um estudo publicado na Revista Latinoamericana de Ciências Sociais e Humanas (Mejía Rubio et al., 2023) mostrou que o mindfulness fortalece funções importantes no TDAH, como memória de trabalho, planejamento e inibição de respostas impulsivas. Essas melhorias são essenciais para o desenvolvimento das crianças e adolescentes no dia a dia.
Além do consultório, o mindfulness também pode ser levado para a sala de aula. O estudo de Seplacan (2022) revelou que, quando professores são treinados para usar atenção plena com crianças com TDAH, há melhora no comportamento e na autorregulação emocional delas. Portanto, essa parceria entre terapeuta, família e escola pode fazer toda a diferença.
Por fim, Silva et al. (2024) também destacam que a prática consistente de mindfulness ajuda a modular comportamentos impulsivos e melhora a relação das crianças com suas emoções.
Benefícios do Mindfulness no Tratamento do TDAH Infantil
Ao integrar mindfulness em sua prática clínica com crianças com TDAH, é possível observar transformações significativas que vão além da superfície. Como vimos os estudos mostram que, com a prática regular, o cérebro da criança começa a responder de forma diferente aos estímulos — especialmente nas áreas relacionadas ao autocontrole, atenção e tomada de decisão.
Entre os principais benefícios observados estão:
- Mais calma e autorregulação emocional: Assim, a criança aprende a reconhecer o que sente no corpo, a nomear emoções e consequentemente a responder com mais consciência, e não apenas por impulso. Isso reduz explosões emocionais e favorece o diálogo.
- Melhora na atenção e foco sustentado: Práticas breves e lúdicas ajudam a criança a “treinar” o cérebro para se manter presente, o que se reflete no desempenho escolar, no brincar e até no vínculo com os cuidadores.
- Redução da impulsividade e da agitação: A medida que aprende a fazer pausas, respirar e observar o que está sentindo, a criança desenvolve mais domínio sobre seus impulsos — uma das grandes dificuldades no TDAH.
- Fortalecimento do vínculo terapeuta-criança: Quando bem conduzido o mindfulness cria um espaço seguro e afetuoso. Isso faz com que a criança se sente acolhida, compreendida e vista, o que fortalece o processo terapêutico.
- Apoio complementar ao tratamento medicamentoso: Nesse sentido, mindfulness não substitui medicamentos quando eles são indicados, mas pode atuar como um poderoso aliado na ampliação da consciência corporal, emocional e comportamental da criança.
Com o tempo, esses benefícios se acumulam. Nesse sentido Siegel e Bryson no livro O Cérebro da Criança, reforçam que “cada experiência vivida molda e reorganiza circuitos cerebrais — inclusive as experiências de presença, escuta e autorregulação proporcionadas por práticas como o mindfulness”.
Como começar a aplicar mindfulness no Tratamento do TDAH Infantil

Antes de apresentar as atividades, é importante entender as bases que sustentam as práticas de mindfulness com crianças. De modo geral, elas se organizam em três pilares principais:
- Práticas de respiração: Regulam o sistema nervoso autônomo, reduzindo a ativação do modo “luta ou fuga”. Ao focar na respiração, a criança aprende a reconhecer o momento presente e a se autorregular emocionalmente.
- Práticas sensoriais: Desenvolvem a atenção plena por meio da observação dos sentidos. Como resultado, estimulam a curiosidade e o ancoramento no aqui e agora sem exigir imobilidade ou silêncio prolongado.
- Práticas de cultivo (como compaixão, gratidão ou gentileza): Fortalecem aspectos emocionais positivos, incentivando conexões interpessoais saudáveis e autocompaixão. Embora mais sutis, podem ser exploradas através de histórias, imagens e atitudes modeladas pelo adulto.
Essas práticas não apenas acalmam, como também promovem a integração cerebral algo que é essencial para o desenvolvimento da autorregulação. Mais uma vez, Daniel J. Siegel e Tina Payne Bryson explicam em O Cérebro da Criança:
“Quando ajudamos uma criança a integrar o cérebro — isto é, a trabalhar com todas as suas partes conectadas — ela se torna mais equilibrada, resiliente e capaz de tomar decisões saudáveis.”
Com base nesses fundamentos, aqui estão algumas formas simples de aplicar mindfulness no seu atendimento:
- Respiração com bolhas de sabão: Incentiva respirações longas e lentas, ajudando a criança a se acalmar.
- Jogo dos 5 sentidos: Peça para a criança notar o que vê, ouve, sente, cheira e saboreia naquele momento.
- Pote da calma com glitter: Uma ferramenta visual e tátil que ajuda a focar a atenção e observar o tempo que as emoções levam para se assentar.
- Histórias e metáforas: Use narrativas lúdicas que favoreçam a compreensão da atenção plena e incentivem atitudes como a gentileza e a paciência.
Dicas para facilitar a prática com crianças
Ao trabalhar com mindfulness no contexto clínico infantil, especialmente com crianças com TDAH, algumas atitudes fazem toda a diferença para garantir que a prática seja acolhedora, eficaz e respeitosa:
- Acolha o ritmo e a natureza da criança (não force a prática):
Não force a prática. Crianças com TDAH podem ter mais dificuldade em permanecer sentadas ou focadas por longos períodos. Em vez de tentar impor o silêncio ou a “calma idealizada”, observe o que é possível naquele momento. Afinal, mindfulness é sobre estar presente como se está, e isso vale também para o terapeuta. - Adapte a linguagem e os formatos para o universo infantil:
Use metáforas, personagens, histórias e objetos concretos (como potes da calma, cartinhas de sentimentos ou sinos). O cérebro infantil responde melhor ao que é simbólico, lúdico e sensorial. Assim, a criança vivencia a atenção plena e não apenas a entenda racionalmente. - Cultive sua própria prática como profissional:
Terapeutas que praticam mindfulness regularmente transmitem mais segurança, presença e regulação emocional durante a sessão. Como diz Jon Kabat-Zinn, “não se pode ensinar o que não se pratica”. Seu próprio estado interno é o primeiro convite à atenção plena no setting terapêutico. - Inclua a família no processo, sempre que possível:
Assim, orientar pais e responsáveis a também trazerem elementos de mindfulness para casa — com leveza e sem pressão — reforça os ganhos terapêuticos. Isso pode ser feito por meio de pequenas tarefas, histórias ou práticas respiratórias simples no dia a dia da criança.
Dica prática: Para começar com algo acessível e eficaz, experimente usar o exercício gratuito “Arco-Íris da Respiração” da minha Biblioteca de Recursos Gratuitos. Ele ensina a criança a conectar respiração e corpo por meio de uma imagem visual e colorida, tornando o processo lúdico e intuitivo. Ideal para sessões curtas ou atendimentos online. Preencha o formulário ao final deste artigo para ter acesso.
Leia também: Birras: Como lidar usando Educação Emocional e Mindfulness.
Conclusão
Em resumo, Mindfulness não é só uma tendência, é uma abordagem baseada em evidências que pode transformar a forma como você atende crianças com TDAH. Incorporar essas práticas na clínica traz benefícios reais e duradouros para o desenvolvimento emocional e cognitivo delas.
Se você gostou desse conteúdo e quer ter mais atividades práticas para usar no atendimento com crianças com TDAH, tenho um Ebook com 30 Atividades Divertidas de Mindfulness para Crianças. É um material pensado para facilitar o seu dia a dia, trazendo ferramentas que unem o lúdico e o terapêutico.
Referências Bibliográficas
Silva, EG, Arata, HC, Alencar, ALV de, & Braga, T. (2024). Meditação atenção plena no tratamento para TDAH . https://doi.org/10.55905/cuadv16n2-ed.esp.207
Seplacan, A. (2022). Autorregulação emocional: mindfulness para crianças com necessidades especiais (tdah) na educação primária. Conheça e compartilhe psicologia , 3 (4), 49–64. https://doi.org/10.25115/kasp.v3i4.8607
Mejía Rubio, A. del R., Núñez Núñez, M., Flores Hernández, VF, & Lara Salazar, M. (2023). Eficácia da atenção plena em crianças e adolescentes com diagnóstico de TDAH: uma revisão sistemática. LATAM Revista Latinoamericana de Ciências Sociais e Humanas , 4 (1). https://doi.org/10.56712/latam.v4i1.444
SIEGEL, Daniel J.; PAYNE BRYSON, Tina. O Cérebro da Criança: 12 estratégias revolucionárias para nutrir a mente em desenvolvimento do seu filho e ajudar sua família a prosperar. São Paulo: Editora: nVersos Editora, 2015.
